conselho permanente de
sOcioS fundadores do sindarspen

Este espaço tem como objetivo,  resgatar a verdadeira história do surgimento do sindicato dos agentes penitenciÁrio do estado do paranÁ. Seus fundadores, quem foram demitidos, as perseguições e quem conspirou contra o surgimento do  sindicato.

Porque a rebelião de 1989 influenciou o surgimento do sindicato dos agentes penitenciários do Paraná. O assassinato do agente penitenciário, Adalberto Gomes da Silva dentro da penitenciária no dia da rebelião pela policia militar,  não teve inquérito policial. A farsa do seguro  de vida em grupo, por que os chefes de segurança, inspetores, e vigilantes de cada unidade, eram usados como boi de piranha para  barrar diretores do sindarspen. Qual a diferença do  sindicalista da época, e os de hoje!!!  Porque o poder muda o perfil de alguns sindicalista...

PARA TANTO, ESTAMOS RESGATANDO FOTOS E PROCESSOS DESDE 1990.  

QUEM TIVER ALGUM MATERIAL, TENDO EM VISTA ESTAR BEM PRÓXIMO O DIA DO AGENTE PENITENCIÁRIO, DIA 13 DE NOVEMBRO.  FAVOR ENTRAR EM CONTATO ATRAVÉS DO SITE.

DIRETORIA DO CONSELHO PERMANENTE DE SOCIOS FUNDADORES 

 
 

Veja fotos em nosso álbum no facebook

 

ACERVO HISTÓRICO  EM HOMENAGEM AOS FUNDADORES DO SINDICATO DOS AGENTES DO SISTEMA PENITENCIÁRIO DO ESTADO DO PARANÁ


 

 

 



ATUAÇÃO DOS CONSELHEIRO SÓCIOS FUNDADORES DO SINDARSPEN EM DEFESA DA ÉTICA E DA MORALIDADE PÚBLICA


Presidiários 

Maria Cristina Castilho de Andrade*
criscast@zaz.com.br

I – Introdução

O americano Chester Himes, em 1937, após passar sete anos na penitenciária por assalto a mão armada, começou a escrever seu primeiro romance: um relato fortemente autobiográfico de suas experiências na prisão. A versão original do livro, “O passado fará você chorar”, foi lançada nos Estados Unidos somente em 1998. “A luta desesperada pela sobrevivência mostrou-me que o único lugar onde estava seguro era dentro de minha própria pele”, diz ele.

Dráuzio Varella, em “Estação Carandiru”, mostra que a perda da liberdade e a restrição do espaço físico não conduzem à barbárie.

“Em cativeiro, os homens, como os demais grandes primatas (orangotangos, gorilas, chimpanzés e bonobos), criam novas regras de comportamento com o objetivo de preservar a integridade do grupo. Este processo adaptativo é regido por um código penal não escrito, como na tradição anglo-saxônica, cujas leis são aplicadas com extremo rigor. 

- Entre nós um crime jamais prescreve, doutor.

Pagar a dívida assumida, nunca delatar o companheiro, respeitar a visita alheia, não cobiçar a mulher do próximo, exercer a solidariedade e o altruísmo recíproco, conferem dignidade ao homem preso. O desrespeito é punido com desprezo social, castigo físico ou pena de morte.

- No mundo do crime, a palavra empenhada tem mais força do que um exército.”

A indiferença é uma prisão a que nos condenamos, como lembra o dramaturgo Bertolt Brecht (1898-1956), que viveu duas grandes guerras, até o período nazista da Alemanha:

“Primeiro levaram os comunistas,

mas eu não me importei com isso.

Eu não sou comunista.

Em seguida levaram alguns operários,

mas não me importei com isso.

Eu também não era operário.

Depois prenderam os sindicalistas,

mas não me importei com isso.

Eu não sou sindicalista.

Depois agarraram os sacerdotes,

mas como não sou religioso,

também não me importei.

Agora estão me levando,

mas já é tarde.”

É sobre esta realidade que vamos refletir um pouco: o detento, seus códigos, a realidade das prisões, a indiferença e até mesmo a rejeição por parte da sociedade. De acordo com dados do Departamento Penitenciário Nacional (DEPEN), em fevereiro de 2002, há 895 estabelecimentos prisionais no país com 167.207 vagas. Sendo a população carcerária de 233.859, o déficit é de 66.917. Presos por sexo: 223.986 homens e 9.873 mulheres.

II – Objetivos da Prisão

São objetivos da prisão: a punição pelo mal causado, a prevenção de novas infrações através da intimidação e a regeneração do condenado. A Lei de Execução Penal ( n.º 7210 de 11/07/1984) garante, ao preso, assistência material, à saúde, jurídica, educacional, social e religiosa e impõe, a todas as autoridades, o respeito à integridade física e moral dos condenados e dos presos provisórios.

III– Como são ss nossas prisões

Em 1994, no 1.º Simpósio do Sistema Penitenciário do Estado de São Paulo, Dr. João Benedito de Azevedo Marques, falou sobre a realidade de nossos presídios, onde não houve mudanças. A fala, na íntrega, está registrada em material da Campanha da Fraternidade – 97:

“ A situação das prisões no Brasil e em São Paulo é um verdadeiro pesadelo. Tirando as exceções, a situação é dramática. (...) Da população presa, 90% é de marginalizados que têm dentro da prisão o mesmo tratamento iníquo e injusto que têm fora. O que dizer da superlotação, dos desvios, da falta de qualificação pessoal, da assistência judiciária incipiente, da morosidade dos processos, da comunidade que não dá emprego aos egressos, de uma reincidência de 60%, dos presos que deveriam estar fora cumprindo outra modalidade de pena? O que vemos é a falência da utilização do instrumento penal. A justiça brasileira existe para punir os marginalizados e pobres. É uma opção preferencial pelos pobres ao contrário.”

Em 1998, de acordo com matéria publicada no jornal “Folha de São Paulo” ( 3.º caderno, p. 5, 17/03/98), o sistema carcerário brasileiro foi denunciado à Comissão de Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas ( ONU). A denúncia foi feita pela organização não-governamental Human Rights Watch, autorizada pela ONU a realizar uma pesquisa sobre o tema em 70 países. A Human Rights Watch denunciou a situação crônica de violação da integridade física dos detentos nas prisões, cadeias e delegacias do país. A entidade também relatou a preocupante superlotação desses estabelecimentos. Após rebeliões e tentativas de fuga, é comum o espancamento e até o assassinato de detentos como forma sumária de “punição”.

A alta taxa de reincidência vem mostrando que a prisão não reabilita o preso: pensam em fazer rebeliões e cometer novos crimes. A distribuição de papéis, funções e tarefas, nas celas, é tarefa do “dono do barraco” e revela o seu grau de poder e de prestígio. O “dono do barraco” pode ser o mais velho ou o que o comprou. A superlotação exige regras precisas e obediência entre os presos, sem isso a coexistência se torna insuportável, gerando conflitos, tensões, desconfianças, brigas, vinganças e até mortes. Quanto mais lotado o xadrez, mais briga, porque não existe o menor espaço para a privacidade. Em setembro de 2000, foi realizada a II Caravana Nacional de Direitos Humanos da Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados, com visitas a presídios do Ceará, Pernambuco, Rio de Janeiro, São Paulo e Paraná. Encontraram, em maioria esmagadora, presos pobres, jovens e semi-alfabetizados. Há carência de funcionários no sistema, presos comendo com as mãos, atiram em presos desarmados e pelas costas. Um deles, J.M.E., do Rio de Janeiro, 31 anos, afirmou: “Já me tiraram a comida e o sol, já levei chute e bofetada. Abriram as pernas da minha mulher, arrancaram a roupa da minha mãe. Não tem mais o que tirar de mim, só ódio”.

Um pequeno relato, por Estado, sobre o que encontraram:

Ceará - Mensagens gravadas com o auxílio de cascas de banana completavam a sujeira. Havia presos que dormiam no chão, sobre a laje. A permanência, em alguns presídios escuros e úmidos, provocava crises nervosas, acesso de choro e doenças as mais variadas, destacadamente a doenças de pele e as bronco-pulmonares. Havia presídios que não recebiam alimentação do Estado. Sobreviviam às custas de parcos mantimentos que lhes eram entregues por familiares, quando nas visitas. Assim, famílias miseráveis que já se deslocavam com dificuldade ao Distrito, descobriam-se na obrigação de evitar que seus filhos morressem de fome. Havia espancamentos e maus tratos por policiais, crime de tortura, celas de isolamento. Em uma cela de isolamento, um buraco, no chão, repleto de baratas.

Pernambuco - Em presídio na Ilha de Itamaracá – Manicômio Judiciário do Estado - a capacidade máxima é para 370 presos. Havia, na época da visita, 1032. No lugar onde a comida era servida aos presos, encontravam-se vazamentos no esgoto. A maioria dos presos estava com tuberculose. O presídio “Aníbal Bruno” de Recife, para 524 presos, contava com 2988. Na cela de segurança, convívio com ratazanas e os presos defecavam em um saco plástico, por não haver instalações sanitárias. Muitos presos doentes: HIV, tuberculose, osteomielite etc.

Rio de Janeiro - Presídio Ari Franco: existia uma sala grande, sem janelas, com um buraco usado como sanitário, onde seria comum a prática de espancamentos. Presídio Evaristo de Moraes: as celas abrigavam uma média de 52 presos. Um deles morrera com sintomas de leptospirose. Outro dormia sobre a água que inundava o banheiro. Havia marcas de ferimentos produzidos por algum tipo de fio.

São Paulo - DEPATRI: não havia remédios disponíveis para os soropositivos. Não tinham acesso a banho de sol. Emprego de choques elétricos sobre os testículos das vítimas. Taubaté: presos sem banho de sol, levando-os ao enfraquecimento. Penitenciária Estadual de São Paulo – Presídio de mulheres : Uma detenta fora punida, sendo encaminhada ao isolamento, por solicitar socorro a uma companheira que estava com sangramento no ouvido. Uma outra, provavelmente portadora de hanseníase, não recebia os cuidados médicos devidos. Penitenciária Feminina do Butantã: espancamento e violência sexual seriam corriqueiros.

Paraná - Presídio Central de Piraquara: um caso de abuso sexual cometido por funcionário contra uma mulher de preso. Quando de rebelião, um agente fora seriamente ferido e teve ruptura de medula.

De acordo com estudiosos, a desumanização nas prisões é uma das causas do agravamento dos problemas mentais na população carcerária. Segregados, depositados, odiados pela sociedade em geral, privados das condições psico-físico-morais-espirituais necessárias à vida, são deliberadamente destruídos e, conseqüentemente, destroem-se uns aos outros.

Foucault, em seu livro “Vigiar e Punir” (Editora Vozes - 1988) questiona: “Para que serve o fracasso da prisão; qual é a utilidade desses diversos fenômenos que a crítica continuamente denuncia? Serve para a delinqüência, indução em reincidência, transformação do infrator ocasional em delinqüente habitual, organização de um meio fechado de delinqüência”.

Afirma Maria Emília Guerra Ferreira que: “As prisões, tal como são concebidas, falam, numa linguagem simbólica, de enjaular, de conter à força, de segurar contra a vontade, de limitar acesso à livre movimentação.” De acordo com a mesma autora, como o sistema carcerário degrada a saúde física e psíquica do detento:

a) é expropriado de seus pertences, que carregam um significado simbólico afetivo, extensivo do seu próprio ser;

b) sofre indignidades físicas, tem que se despir diante de outras pessoas que lhe são desconhecidas. É um sistema invasivo;

c) exposição contaminadora, falta de espaço ligado à mais restrita individualidade, como, por exemplo: banheiros sem porta no mesmo compartimento onde estão vários presos;

d) violação das comunicações;

e) castigos não previstos por lei, mas por normas de cada presídio, às vezes com manifestações sádicas ou neuróticas de quem os aplica.

IV – Quem são os nossos encarcerados

Jovens. A maioria tem menos de 30 anos. Isso se deve não só ao maior número de jovens na sociedade, mas às dificuldades que ele enfrenta para entrar no mercado de trabalho. Há, ainda, milhares de dependentes de droga que, desde a adolescência, entram para o mundo do crime para sustentar o vício. O preso não tem formação educacional e profissional e é abandonado, muitas vezes, pela família.

Maria Emília Guerra Ferreira, no livro “ A Produção da Esperança – Casa de Detenção de São Paulo, Carandiru” apresenta dados comuns a todas as cadeias: o histórico familiar aponta, para a grande maioria dos detidos, a total ou parcial ausência da figura masculina. Quer por abandono do lar, quer por ter sido uma relação causal, quer ainda por problemas ligados à embriaguez, drogas, jogo, ou também por ausências que se devem à necessidade de trabalhar.

A ausência e o abandono por parte da figura paterna e a fragilidade e distância, por sobrecarga de filhos e trabalhos, da figura materna, além dos núcleos de carência na personalidade dos presos, levaram-nos a tomar contato desde cedo com a “liberdade” e a “lei” da rua e dos bandos. Em geral eles são provenientes de lares onde a ausência dos pais e dos adultos se faz necessária por questões de sobrevivência. Nessa circunstância, eles ficaram entregues aos cuidados de um irmão ou irmã mais velha, criança como eles, presas fáceis de bandos e organizações marginais que aliciaram, “cuidaram” e “prepararam” para a vida. Os vínculos mais fortes dos presos são a mãe e os filhos. Mesmo que, quando em liberdade, eles não tenham dado, aos filhos, muita presença, muita assistência, quando presos, o sentimento paternal aflora e os filhos passam a fazer parte do seu mundo de referências e preocupações. As esposas e companheiras aparecem como depositárias de amor, mas também porque elas respondem a uma necessidade física, afetiva e sexual. Muitos presos, sem ter o que fazer, trocam idéias sobre as maneiras mais eficientes de burlar a lei. O ambiente de violência provoca comportamentos agressivos e condutas mentirosas. A convivência entre presos primários e reincidentes, com certos funcionários e policiais corruptos e arbitrários, enfim, tudo na prisão contribui pa-ra piorar, em vez de melhorar, a condição moral e humana das mulheres e homens pre-sos. Essas constatações, segundo o Texto Base da Campanha da Fraternidade de 1997, levam a considerar as prisões verdadeiras escolas e mesmo universidades do crime.

Em questionário aplicado na Cadeia Pública de Jundiaí, sendo respondido por 111 detentos, encontramos:

O que leva uma pessoa a cometer atos contra a lei:

42% - desemprego, necessidades materiais, baixos salários;

16% - uso de drogas;

12% - falta de orientação e apoio e

30% - outros ( desajustes emocionais, problemas familiares, malandragem e má índole, más companhias, falta de formação, discriminação, desespero).

O que existe de pior numa cadeia:

24% - superlotação;

20% - problemas de relacionamento;

16% - falta de assistência judiciária;

16% - ficar fechado;

14% - falta de atividades;

08% - péssimas acomodações e

02% - outros.

As maiores dificuldades quando a pessoa sai da cadeia:

55% - emprego;

43% - discriminação(incluindo-se a família);

02% - outros.

No livro, “A Produção da Esperança” de Maria Emília Guerra Ferreira, págs. 144 e 145, há a história de Tomás, um preso que cresceu na Praça da Sé, segundo ele correndo da polícia, do povo, da chuva, da fome, da dor:

“Vou contar pra senhora uma história de verdade – eu me criei na praça da Sé. Saí de casa porque o homem que minha mãe arrumou depois que meu pai abandonou ela, quando eu era pequeno, começou a beber muito, brigava com nós todos, batia na gente e maltratava demais. Minha mãe não agüentava nós e ele. Saí de casa e vim pra Sé. É a lei da selva. Pra sobreviver tem que ser artista. Comecei a fazer como os outros meninos, “acharcava”, cheirava, fumava etc. Um dia achei um cachorrinho bem novinho abandonado. Comecei a cuidar dele. Ele comia na minha mão, conhecia quem eu era. Ele só andava comigo, dormia comigo. (...) Muitas vezes quando eu tinha muito medo, me agarrava com ele, quando chovia muito ou fazia muito frio, dormia abraçado com ele. Uma madrugada, a gente estava dormindo e chegou a polícia. Veio envenenada, batendo em todo mundo. Queriam saber de um roubo. Assaltaram um cara lá, a polícia veio e a turma saiu, escapou e deram um pontapé na polícia. Eles queriam se vingar em cima de nós. Foi uma pancadaria. Um deles quando viu o meu cachorro agarrou ele e furou todo ele. Eu fiquei cego de ódio, parti pra cima deles e quanto mais eu batia mais apanhava. Na Febem falaram pra mim da vida humana. Que vida humana? A deles ou a minha? Pra mim o meu cachorro era mais importante que tudo. Por que eles fizeram aquela covardia? O que o meu cachorro fez pra eles? Nada. (...) Pra senhora ver, esta foi a minha escola de vida. Pra mim meu cachorro é que valia. Aquele policial, aquele homem que ficou com minha mãe, meu pai que me abandonou quando eu era bem pequeno, os homens que vivem querendo pegar a gente e tanta coisa ruim que a senhora nem pode imaginar porque a senhora nasceu numa casa, teve pai e mãe e tudo que precisava. Nunca ficou jogada no mundão sozinha tendo que se virar”.

Ser abandonado, segundo a autora, é sentido como ser negado. Ele se identificou com o cachorro abandonado e, cuidando dele, cuidou de si mesmo, para não se desestruturar. No cachorro projetava seus medos e o seu imaginário, que o transformavam em “mãe”. A revolta de Tomás é o desejo do direito a viver, a se desenvolver, a amar. Outra situação grave, citada por Maria Emília, é a dos indultos por doenças terminais que, apesar de ser um direito legal, mesmo nos casos em que todos os exames estejam completos, emperram no Judiciário. A pessoa acaba morrendo na cadeia.

V – Causas das rebeliões

As causas mais comuns das rebeliões são:

-        superlotação( quanto mais superlotado o xadrez, mais brigas, porque não existe o menor espaço para a privacidade);

-        transferência de presos já condenados para o sistema penitenciário;

-        morosidade da Justiça, falta de assistência judiciária, falta de informações sobre andamento de processos, pedidos etc.;

-        presos com direito a benefícios, sem assistência;

-        presos com penas vencidas, permanecendo presos;

-        falta de assistência médica;

-        espancamentos e tortura.

Em todas essas questões, os presos têm seus direitos assegurados por lei.

Em casos de rebelião, negociar ou não? A coordenação nacional da Pastoral Carcerária, em documento sobre o assunto, destaca o valor fundamental: a VIDA. Seja ela do refém, do agente penitenciário, do preso, do soldado. Sendo possível garantir e preservar a VIDA de quem quer que seja, impõe-se o dever de garanti-la e preservá-la e isso implica no dever de buscar a negociação e a via dialógica. A negociação é testemunha da seriedade das autoridades ao garantir a VIDA de todos.

VI - Como humanizar as prisões

De acordo com as orientações para a Campanha da Fraternidade de 1997: “ Cristo Liberta de Todas as Prisões”, entre os caminhos para humanizar as prisões encontramos:

-        só punir como crime condutas que lesem de forma grave a sociedade; transformar ilícitos penais em ilícitos civis, cujas penas sejam pagamento de multas, sanções, reparações, prestação de serviços etc.;

-        criar os Conselhos de Comunidade onde Estado e sociedade partilhem a responsabilidade pela questão penitenciária agilizando o atendimento das necessidades básicas de presos e presas;

-        incentivar a participação de entidades no Patronato particular favorecendo a assistência aos presos e acompanhamento dos egressos;

-        capacitar, permanentemente, funcionários das prisões e da Polícia – civil e militar – para uma atuação educativa, humana e estritamente dentro da lei;

-        remunerar, condignamente, esses funcionários;

-        eliminar a extrema morosidade e burocratização da Justiça;

-       prestar assistência jurídica, médica e religiosa aos presos e presas.

São importantes ainda:

-        programas municipais de incentivos às empresas que empregarem egressos do sistema penitenciário;

-        estímulo à oferta de serviço aos detentos em regime fechado;

-        criação de oficinas de trabalho a fim de viabilizar a profissionalização e trabalho aos presos;

-        estágios dentro dos presídios, notadamente junto aos cursos de Direito ( para assistência judiciária aos internos), Medicina e Psicologia;

-        estabelecer um rol de serviços importantes para a comunidade que possam ser aproveitados nas execuções das penas alternativas e garantir que na execução das mesmos haja o respeito aos princípios de educação e ressocialização do preso.

O Papa João Paulo II, em sua mensagem para o Jubileu nos Cárceres, conclui que “ para tornar mais humana a vida na prisão, é muito importante prever iniciativas concretas que permitam aos reclusos realizar, na medida do possível, atividades laborativas capazes de retirá-los do envilecimento do ócio”. Recorda, ainda, a necessidade de acompanhamento psicológicos para os problemáticos da personalidade. “O cárcere não deve ser um lugar de deseducação, de ócio e talvez de vício, mas de redenção”.

VII – Perspectiva cristã

“ Vinde, benditos de meu Pai, recebei em herança o Reino que foi preparado para vós desde a fundação do mundo. Porque eu estava nu, e me vestistes; doente e me visitastes; na prisão, e viestes a mim” ( Mt 25, 34-36).

Em visita ao cárcere de Paggioreale em Nápoles, em 11/11/1990, o Papa João Paulo II coloca: “Um homem que sofre de solidão é ameaçado por várias preocupações da alma, busca remover a morte de junto de si, e sofre uma pavorosa perda de esperança. É este o homem que somos chamados a evangelizar hoje.(...) Jesus não coloca em ressalto, nem a culpa nem a condenação, mas a total possibilidade de renascer a uma vida nova, no perdão e no amor. O Evangelho é verdadeiramente uma Palavra que consola, ainda que exigente; é um fermento que renova, uma chama que devolve a vida ao homem”.

A defesa de Jesus, na cruz, veio de um condenado como Ele. O marginalizado se solidarizou com seu companheiro de suplício e acreditou que Ele teria também compaixão. E Jesus não fez discursos moralistas nem recordou que o solicitante não possuía méritos para tanto. Garantiu ao sentenciado: “ Hoje mesmo estarás comigo no paraíso”.

O Papa João Paulo II, em sua mensagem para o Jubileu nos Cárceres, diz que Deus quer salvar todos os seus filhos, especialmente aqueles que, tendo-se afastado dEle estão à procura do caminho de volta. “O Bom Pastor segue continuamente o rasto das ovelhas perdidas e, quando as encontra, toma-as sobre os ombros e as reconduz ao redil. Cristo procura encontrar-se em cada ser humano, em qualquer situação que se encontre. O objetivo do encontro de Jesus com o homem é a salvação deste. Uma salvação, aliás, que é proposta, não imposta. Cristo espera do homem uma confiante aceitação, que abra a sua mente a decisões generosas, capazes de remediar o mal cometido e promover o bem”. Outro trecho também vale ser salientado: “O Jubileu lembra-nos de que o tempo é de Deus. E não escapa a este senhorio de Deus o tempo de detenção. Os poderes públicos que, em cumprimento de uma disposição legal, privam da liberdade pessoal um ser humano, pondo como que entre parênteses um período mais ou menos longo de sua existência, devem saber que não são senhores do tempo do recluso. Do mesmo modo, quem se encontra detido não deve viver como se o tempo da prisão lhe fosse subtraído irremediavelmente: também o tempo transcorrido no cárcere é tempo de Deus e como tal deve ser vivido; é tempo que há de ser oferecido a Deus como ocasião da verdade, de humildade, de expiação e também de fé.(...) Cada um é chamado a sincronizar o tempo do próprio coração, único e irrepetível, com o tempo do coração misericordioso de Deus, sempre pronto a acompanhar, ao ritmo de seu passo, até à salvação. Embora, às vezes, a condição carcerária corra o risco de despersonalizar o indivíduo, privando-o de muitas possibilidades de se exprimir publicamente, o recluso deve lembrar que, diante de Deus, não é assim: o Jubileu é o tempo da pessoa, em que cada um é ele mesmo diante de Deus, à imagem e semelhança d’Ele. E cada um é chamado a acelerar seu passo rumo à salvação e a progredir na descoberta gradual da verdade sobre si mesmo”.

Critérios que podem nos orientar, na realidade dos cárceres, de acordo com o Texto-Base da Campanha da Fraternidade – 97( pág. 79):

-        a sacralidade da vida humana em todas as situações e em todos os aspectos, incluindo aí os direitos de vítimas e agressores;

-        a necessidade de sermos, como cristãos, sinais de libertação e reconciliação;

-        a relação entre os valores que uma sociedade cultiva e a instalação de maior ou menor grau de violência;

-        a gratuidade como forma privilegiada de derrotar o mal;

-        a imparcialidade da justiça e a garantia de todo o cidadão, como condição para impedir a desmoralização dos caminhos legais;

-        a compaixão diante de quem sofre, seja por conseqüência de seus próprios atos, seja por delitos de outros;

-        a necessária ação dos cristãos no sentido de prevenir o mal, trabalhando na erradicação das causas, em colaboração com todas as pessoas de boa vontade.

Quando Deus olha, Deus cuida. Diz Santa Teresinha: “ O olhar de Jesus não se dirige às nossas obras, mas vai mais no fundo de nós mesmos. Ele só vê o nosso coração. (...) Todo o olhar de Deus para nós é um olhar de amor. E o olhar de Jesus não é só para os justos e consagrados, mas para todos, incluindo os grandes pecadores”.

O cristão que vai visitar a cadeia, deve olhar a realidade para cuidar dela; o cristão que vai visitar as cadeias precisa ter o cheiro de Deus, o cheiro do Evangelho em sua vida, para interagir com o cheiro do preso, o cheiro do cárcere.

VIII – O que faz a Pastoral Carcerária

A assistência religiosa faz parte dos direitos dos presos, assegurada pela Lei de Execução Penal:

Art. 41 – Constituem direitos do preso:

...VII – assistência material, à saúde, jurídica, educacional, social e religiosa.

A Pastoral Carcerária é a presença da Igreja de Cristo no mundo dos cárceres. Ela vai às cadeias visitar presos e presas com os mesmos sentimentos e valores que motivaram o próprio Jesus em sua prática junto ao seu povo, ao mesmo tempo que já O encontra lá, na pessoa de cada irmão encarcerado.

A Pastoral testemunha a gratuidade e fidelidade do amor de Jesus para com o seu povo, especialmente junto aos marginalizados e excluídos de sua época. Por isso, a Pastoral Carcerária vai ao encontro de todos e tenta ajudá-los sem distinção, perguntando-se: O que Jesus faria com esses presos, nesta prisão? O que Ele lhes diria? Como Ele os trataria? E o que Ele falaria às autoridades sobre a situação em que esses presos se encontram? Os parâmetros mínimos para o trabalho, de acordo com a coordenação nacional da Pastoral Carcerária, ligada à CNBB, são:

1)     atender a todos os presos, não escolhendo os presos com quem vai trabalhar;

2)     não cobrar práticas religiosas dos presos como “pagamento” dos trabalhos da Pastoral Carcerária;

3)     ter, em sua visão e prática, uma abertura ecumênica;

4)     incentivar e participar na criação/instituição do Conselho da Comunidade(LEP, artigos 4,80-81) onde ele ainda não existe. Onde o conselho da Comunidade já existe, a Pastoral Carcerária deve procurar ter representação nele, em colaboração com outras entidades igualmente qualificadas na questão prisional;

5)     manter relação de trabalho e contato permanente com o Judiciário e o Ministério Público locais, visando incentivar o cumprimento da LEP;

6)     ter atitude profética diante das violações dos Direitos dos presos, especialmente na questão de tortura e/ou maus tratos.

Como trabalha a Pastoral Carcerária na Diocese de Jundiaí – SP

Tentando ser presença de Cristo e de sua Igreja no mundo dos cárceres, desenvolve todos os trabalhos que esta presença vem a exigir, bem como também incentiva e interessa outros setores da comunidade de fé e da sociedade civil para o encaminhamento adequado da questão prisional.

A sua ação fundamenta-se nos valores evangélicos da fraternidade, defesa e promoção da vida de todos, misericórdia, solidariedade, justiça e a construção do Reino.

Algumas situações encontradas na cadeia:

-       problemas de assistência judiciária;

-       problemas de saúde;

-       falta de roupa ou agasalho;

-       presos sem nenhum contato com familiares;

-       presos doentes mentais;

-       presos menores de idade;

-       presos ameaçados;

-       presos desejos de aprender mais sobre a sua fé;

-       presos desejosos de alguma celebração de sua fé-esperança de vez em quando;

-       egressos sem apoio e sem emprego.

Atividades :

-       visita aos domingos, pela manhã, com anúncio do Evangelho de cela em cela;

-       entrega de material de doação para confecção de peças artesanais. Em Jundiaí, é aplicada a transação penal com aplicação imediata de pena restritiva de direitos consistente na prestação de serviços à comunidade, mediante a entrega de matéria-prima para artesanato para os detentos;

-       fornecimento de declaração das peças confeccionadas para remição de pena. Cada três dias trabalhados abate um;

-       entrega de remédios, a partir de receita médica, para os detentos que não possuem família;

-       entrega de correspondência no Correio;

-       correspondência, pela Pastoral, com presos que são transferidos para outras cadeias;

-       entrega de produtos de higiene pessoal;

-       celebrações mensais organizada pela Renovação Carismática Católica;

-       contato com familiares;

-       solicitação a outras Pastorais como da Saúde, Moradia, da Mulher, do Menor e a Movimentos como Vicentinos;

-       encaminhamento de egressos e/ou familiares para suas paróquias;

-       contato permanente com Delegado Diretor da Cadeia, Delegado Seccional, Juiz Corregedor e Promotora do presídio;

-       distribuição de cobertores doados pelo Fundo Social de Solidariedade da Prefeitura Municipal.

Maiores informações com Eurides Farinelli - Coordenador Diocesano: (11) 9907-7703/ (11) 4607-7708.

IX – “Entre a vida e a morte, a vida é mais forte”

(Frase de Giselda Caltelvechi – tema de uma missão da comunidade dos sofredores de rua).

“ Na Esperança é que fomos salvos”, diz São Paulo aos Romanos 8,24.

E no livro “A Maior Esperança” (Vozes, 1970) de Comblin, encontramos:

“ O papel da Esperança é abrir uma espera situada além de todas as formas de espera vividas conscientemente pelos homens. (...) A esperança não é espontânea no homem. Espontâneos são os desejos, os sonhos, as projeções, mas não a esperança. Esta há de ser cultivada. É trabalho perseverante e sistemático. (...) Educa-se a esperança.”

Na esperança, detentos constróem barcos. Penduram-nos nas celas. Olham distante. Desejam o horizonte.

Por certo buscam os versos de Adélia Prado no poema “Janela”:

“Janela, palavra linda.

Janela é o bater das asas da borboleta amarela.

Abre pra fora as duas folhas de madeira à-toa pintada,

janela jeca, de azul (...)

Janela sobre o mundo aberta...

Ó janela com tramela (...)

Clarabóia na minha alma,

olho no meu coração.”

Canta Zé Vicente:

UTOPIA

Quando o dia da paz renascer,

quando o sol da esperança brilhar,

eu vou cantar...

Quando as cercas caírem no chão...

eu vou cantar.

Quando os muros que cercam os jardins

destruídos , então os jasmins

vão perfumar.

Vai ser tão bonito

se ouvir a canção

cantada de novo.

No olhar do homem

a certeza do irmão.

Concluo com as palavras de Kiko Argüelo, iniciador das Comunidades Néo-Catecumenais: “Amar significa morrer, e nossa tragédia consiste justamente no fato de não querermos morrer. Amar o outro quando ele é diferente daquilo que eu gostaria, significa sempre um salto no escuro, significa superar a morte”.

 

X – Bibliografia

CHESTER, Himes – “O Passado fará você chorar” – 1999 – Record – Rio de Janeiro.

CNBB- “Elementos para uma Pastoral Carcerária” – 1989 – Ed. Loyola – São Paulo.

CNBB – Texto-Base CF 97 – “Cristo Liberta de Todas as Prisões” – Editora Salesiana Dom Bosco – São Paulo.

COMBLIN, J. A. - “A Maior Esperança” (Coleção Meditações Evangélicas) – 1970 – Editora Vozes – Petrópolis.

FERREIRA, Maria Emília Guerra – “A Produção da Esperança” – Casa de Detenção de São Paulo, Carandiru - 1996 - Editora da PUC – São Paulo.

MENGONI, Júlio; ZOCCA, Lorenzo; CAROTENUTO, Gennaro e SPAGNOULO, Silvano – “No cárcere porém livres” – 1998 – Edições Loyola – São Paulo.

PAULO II, João – “Mensagem do Sumo Pontífice para o Jubileu nos Cárceres” – 2000 – Edições Paulinas – São Paulo.

PRADO, Adélia – “Poesia reunida” – 10a. edição – 2001 – Editora Siciliano – São Paulo.

VARELLA, Drauzio – “Estação Carandiru”- 7a. reimpressão – 1999 – Companhia das Letras- São Paulo


Responsável, na Diocese de Jundiaí - SP, em 1993, pelo reinício da Pastoral Carcerária e autora de “Nos Varais do Mundo/ Submundo”, 2001 - Edições Loyola.